16 de março de 2009

Confie no próprio taco.



Confie no próprio taco
Marcelo Cherto

Quando voltei do Mestrado na Universidade de Nova York e comecei a advogar em São
Paulo, eu tinha 24 anos. E, apesar dos ternos sisudos e da barba que ostentava, era umgaroto.
E tinha cara de garoto. Mas era bom advogado.
Um belo dia, por indicação de alguém, recebi um figurão, homem de muita grana, arrogante, com aquela pose que só os herdeiros de belas fortunas têm. Ele me expôs uma transação que pretendia fazer,pedindo-me para analisar a montagem jurídica sugerida pelos advogados de sua empresa.
Burramente, não falei em honorários.

Apenas lhe pedi uns dias para estudar o assunto e mergulhei com vontade na imensa pilha de documentos que ele me deixou.
Uma semana depois, me reuni com ele para mostrar a solução que havia bolado, 100%
dentro da lei e que lhe gerava uma economia sensível de impostos, por volta aí de uns
500 mil dólares. Como a coisa toda era muito técnica, expliquei a estratégia por alto e entreguei ao homem um roteiro datilografado em cinco páginas de papel timbrado, para que ele o entregasse a seus advogados internos, encarregados da execução dos documentos.

Ele perguntou quanto me devia e eu, que ainda não havia aprendido que preço não tem
nada a ver com custo, calculei as horas que havia gasto e respondi “dez mil dólares”. O homem fechou a cara e, de forma rude, para me intimidar, perguntou como eu tinha a coragem de cobrar dez mil dólares por cinco folhinhas de papel.

Esbravejou que dava dois mil dólares por folha e que isso era um absurdo.
Minha vontade era chutar o cara para fora da sala, mas eu tinha trabalhado como um
mouro e precisava daquela grana. Portanto, me fiz de humilde, pedi desculpas e disse a ele que tinha razão, que realmente era um absurdo cobrar tanto por cinco folhinhas depapel e que eu iria reparar o meu erro. O sujeito ficou todo feliz.

Abria a gaveta, tirei cinco folhas de papel timbrado em branco, coloquei-as num
envelope e o entreguei ao cliente, dizendo: - “isto é uma cortesia, não lhe custará nemum centavo”.

Ele explodiu: - “mas estas folhas estão em branco! Não há nada escrito
nelas!”
E eu, calmamente, respondi: - “mas afinal, o que é que o senhor veio buscar aqui? Por
sua fala anterior, pensei que eram folhas de papel timbrado. Se é isso, aí estão elas. E não lhe custam nada”. E prossegui: - “porém, se o que o senhor veio comprar aqui não
são as folhas, mas sim o que está escrito nelas, aí vai ter que pagar. Afinal, para poder escrever o que escrevi, detalhando uma solução que vai lhe economizar pelo menos 500 mil dólares, foram necessários anos de estudo e uma semana mergulhado numa
montanha de papéis.

E isso tem um preço. E tem mais: se quiser levar o roteiro, vai
pagar, não mais dez mil, mas sim vinte mil dólares, pelo desaforo de me tomar por um
vendedor de papel”.
O desfecho foi o que eu antecipava, mas apenas em parte. Eu esperava que ele pagasse e ele pagou. Bufando, mas pagou.

Mas eu também esperava que ele nunca mais me procurasse e saísse falando mal de
mim. E ele não apenas voltou a me contratar para outros casos, como ainda me indicou
para vários amigos. Sempre dizendo - “esse advogado é bom. Não leva desaforo para
casa e não se deixa enrolar”.

E eu aprendi, de uma vez por todas, que quem quiser ser dono do próprio negócio
precisa, antes de mais nada, acreditar no próprio taco. E não ter medo de defender as
coisas em que acredita.

Marcelo Cherto é presidente do Grupo Cherto (www.cherto.com.br), membro da
Academia Brasileira de Marketing e integrante do Global Advisory Board da Endeavor.

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